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Com o objectivo de contribuir para o conhecimento disponível sobre as terapias complementares e a sua integração na área da saúde, Marcela Jussara Miwa realizou uma tese de doutoramento que incluiu o Reiki. Em entrevista, a investigadora esclarece as conclusões a que chegou e revela a intenção de prosseguir os seus estudos, desta vez sobre Reiki nos hospitais.

“Com o poder nas mãos: um estudo sobre Johrei e Reiki” é o título da tese de doutoramento levada a cabo por Marcela Jussara Miwa, na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo. Para a sua realização, desenvolveu pesquisa em dois campos distintos: um Núcleo de Reiki e a Igreja Messiânica Mundial, ambos em Ribeirão Preto, São Paulo, entre Outubro de 2009 e Janeiro de 2012. Participaram no estudo 15 reikianos e cinco frequentadores do Núcleo, mais 14 messiânicos e cinco frequentadores da Igreja.

Entre os principais resultados, a investigadora salienta que “a crença no poder curativo dessas energias, Reiki e Johrei, aparece como principal sustentação de sua eficácia”. Por outro lado, refere que “tanto os ensinamentos da Igreja Messiânica como os ensinamentos e teorias associadas ao Reiki, foram capazes de fornececer novos sentidos para questões ou problemas desses sujeitos, modificando comportamentos como humor, agressividade, tolerância e sociabilidade, possibilitando a emergência de uma «identidade holística» e a configuração de novas «comunidades de encantamento» em torno dessas suas práticas”.

O que é que a motivou a escolher este tema para a sua tese de doutoramento?

O meu interesse pelo Reiki começou quando eu realizava a minha pesquisa de mestrado. Na época, estudei imigrantes japoneses no Brasil durante a Segunda Guerra Mundial. Para compreender certos costumes e tradições desses imigrantes, fiz algumas aulas de idioma e cultura japoneses. A professora de japonês era mestre reikiana e apresentou-me a técnica. Interessada pelo assunto, iniciei-me nos níveis I, II e III (ou 3A) do Reiki, além de incentivar alguns familiares a fazerem o mesmo. Devido à minha profunda curiosidade pelo tema, efectuei estudos sobre técnicas de energização pelas mãos, paralelamente à minha pesquisa de mestrado. Conheci outros reikianos e mestres de Reiki e ao constatar algumas divergências nas teorias que apresentavam sobre a técnica, além das contradições entre os ideais que defendiam e seus comportamentos, resolvi elaborar uma pesquisa mais aprofundada. A princípio, o meu projeto de doutoramento incluía mais técnicas de energização, como toque terapêutico, cura prânica, mahikari e passe espírita, porém, por uma questão de tempo e viabilidade da pesquisa, acabei por restringir o meu estudo apenas ao Reiki e ao Johrei da Igreja Messiânica Mundial.

Sentiu abertura da parte da Universidade para a realização desta pesquisa, apesar de os campos de investigação incidirem sobre o Reiki e o Johrei?

Durante a entrevista do processo selectivo para o doutoramento, na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, uma das professoras teceu o seguinte comentário: “Não sei se a aprovo porque o seu projecto é muito original, ou se eu a reprovo justamente porque o seu projecto é muito diferente do que estamos acostumadas a estudar.” Felizmente fui aprovada e, posteriormente, essa mesma professora foi quem me apresentou a Igreja Messiânica em Ribeirão Preto-SP, cidade onde realizei toda a minha pesquisa de campo. No meio académico, a minha maior dificuldade foi, e ainda é, conseguir publicar artigos científicos nas revistas da área da Saúde.

Quais foram os principais objectivos que se propôs atingir com a pesquisa?

Pessoalmente, quis compreender melhor as teorias sobre Reiki e Johrei, as suas semelhanças e diferenças, saber quem são as pessoas que praticam essas técnicas e em que é que elas acreditam realmente. Academicamente, o meu intuito foi contribuir para o crescimento das pesquisas sobre o uso de terapias complementares e integrativas na área da Saúde, principalmente as que dizem respeito às técnicas de energização pelas mãos, como o Reiki, por exemplo, cuja utilização em hospitais está a aumentar e poucos estudos são encontrados a esse respeito.

No decurso da investigação, quais foram os maiores desafios que teve de enfrentar e como é que os ultrapassou?

Estudar os grupos de Reiki e Johrei foi bom. Quando me sentia cansada ou triste no local de pesquisa aproveitava para receber Reiki ou Johrei dos praticantes, sempre muito solícitos em ajudar-me. Como adoptei a etnografia como método de pesquisa, isso levou-me a uma convivência de maior duração e intensidade com os grupos – frequentei por mais de um ano cada local – facto que, por alguns momentos, me desgastou um pouco. Se por vezes cogitei a possibilidade de desistir da pesquisa, tal foi muito mais por questões de ordem pessoal do que académicas (parentes e pessoas próximas passaram por graves problemas de saúde durante o meu doutoramento, o que consumiu boa parte do meu tempo, energia e dedicação). Com um pouco de paciência e perseverança tudo se resolveu.

Concluiu que a crença no poder curativo destas energias aparece como a principal sustentação da sua eficácia. Apesar de estar no papel de investigadora, logo, com uma missão de imparcialidade, de que forma a sua crença pessoal foi, ou não, afectada?

Os sujeitos que entrevistei demonstraram interesse pelo Reiki ou pelo Johrei, motivados pelos benefícios que poderiam receber (cura, relaxamento, equilíbrio energético, solução de problemas, etc.) e por meio dessa crença conseguiram efectuar mudanças nos seus comportamentos e visões do mundo, o que também contribuiu para darem outros, ou novos, sentidos àquilo que enfrentavam, tornando mais fácil suportar alguns sofrimentos. A minha maior preocupação é quando a crença vira motivo para preconceitos, ou seja, entristeço-me quando vejo alguém defender a sua técnica como¬ a melhor, como a verdadeira. Como estudiosa e curiosa que sou a respeito dessas técnicas de energização, percebo que todas elas estão voltadas para o bem-estar e o aprimoramento dos sujeitos. Se há variações nas teorias e procedimentos, isso se deve ao fundador de cada prática, tendo, para isso, que se relevar o contexto (aspectos históricos e sociais) em que essas práticas surgiram. Se alguns percebem mais benefícios que outros, talvez seja pelo facto de estarem mais ou menos “afinados” com as energias subtis.
Acredito realmente nessa ideia de “afinidade energética” e esforço-me para levar uma vida mais equilibrada, segundo as minhas crenças particulares. Há mais de seis anos evito a ingestão de qualquer tipo de carne, pois sinto-me desconfortável ao pensar que, para meu deleite gastronómico, eu tenha que causar sofrimento e morte de um animal (mas nada contra os carnívoros). Mantive os ovos e leite na minha dieta por perceber que a ausência destes causariam deficiências no meu organismo. Pratico meditação sempre que possível e tento não cultivar demasiadas expectativas em relação ao futuro, isso ajuda a diminuir a ansiedade e, também, as frustrações. Procuro também retribuir as dádivas que recebo de Deus e/ou Universo, ajudando as pessoas no que for possível, dentro das minhas condições e limitações.

Em relação ao Reiki especificamente, concluiu que o mesmo possibilita a criação de uma “identidade holística” e até a configuração de novas “comunidades de encantamento”. O que é que pretende significar exactamente com isto?

Nalguns dos seus estudos, o sociólogo Max Weber constatou que a crescente racionalização do mundo e o progresso científico contribuíram para a depreciação de outras formas de conhecimento (como o religioso, o mágico, o popular, etc.) e para a gradativa exclusão da magia e dos aspectos transcendentais para explicar o vivido – o que Weber identificou como processo de “desencantamento do mundo”. Quando defendo a ideia de que tanto o Núcleo de Reiki como a Igreja Messiânica que estudei se configuram como “comunidades de encantamento”, estou a apontar para o facto que, mesmo estando imersos numa sociedade pautada pela racionalidade científica, esses grupos cultivam outras formas de pensar e conceber o mundo que os cerca, atribuindo outros sentidos para o sofrimento e fundamentando as suas crenças em aspectos que fogem da compreensão da racionalidade científica, como por exemplo, a energia subtil. A possibilidade de esses grupos se reunirem num local de crenças comuns também oferece o acolhimento e a sociabilidade que não encontraram noutras esferas da sociedade.
Quanto à “identidade holística”, refiro-me a uma dada forma de estar no mundo que atenta para os aspectos psicoemocionais e energéticos do sujeito e a maneira como eles influenciam na qualidade de vida e interferem nas relações sociais.

Tem interesse em aprofundar os seus conhecimentos em relação ao Reiki?

Como mencionei anteriormente, fui iniciada em Reiki até ao nível III (ou 3A), faltando-me somente o nível de mestre. Creio que iniciar pessoas é uma responsabilidade muito grande e pondero que não tenho a capacidade para assumir esse compromisso por enquanto. Por ora, acredito que a melhor maneira de contribuir para o Reiki é prosseguir os meus estudos sobre a técnica e tentar divulgar ao máximo o conhecimento que adquiri.

Pondera continuar a investigar estes temas a nível académico?

Sim. Estou a cogitar a possiblidade de prosseguir os meus estudos com uma pesquisa de pós-doutoramento sobre o uso de Reiki em hospitais. Ainda estou a fazer os ajustes no projecto e a analisar os locais para a pesquisa. A realização de tal empreitada dependerá da aprovação por parte das agências de financiamento de pesquisa.

Quer deixar alguma sugestão aos nossos leitores?

Por ora tenho muito pouco a acrescentar além daquilo que apresentei na tese de doutoramento. Sobre técnicas de energização pelas mãos, gostaria de mencionar dois livros que não constam nas referências bibliográficas da minha tese e que são muito interessantes: All love – a guidebook for healing with sekhem – seichim – reiki and skhm de Diane Ruth Shewmaker e A luz que cura – oração pelos doentes de Agnes Sanford. Talvez os leitores já os conheçam, mas para quem ainda não leu, vale a pena conferir.
Agradeço imensamente pela oportunidade de divulgar meu trabalho. E desejo muita paz a todos os corações.

[box type=”info”] Marcela Jussara Miwa é cientista social e mestre em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e doutora em Ciência pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.

Pode ver a Tese de doutoramento sobre Reiki de Marcela Jussara Miwa aqui:
“Com o poder nas mãos: um estudo sobre Johrei e Reiki”
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